Historiador e secretário do Ministério da Cultura, Célio Turino lança livro sobre a experiência de políticas públicas dos Pontos de Cultura, referência na América Latina. Por Aline Carvalho Se os Pontos de Cultura são o Brasil de baixo pra cima, a última publicação de Célio Turino é um livro de trás para frente. Uma narrativa não-linear, mas didática, que mistura análise sócio-política com histórias cotidianas e poesia. Com prefácio do sociólogo Emir Sader, o livro “Ponto de Cultura – o Brasil de baixo para cima” traz a experiência do programa Cultura Viva e sua principal política, os Pontos de Cultura, que foram concebidos pelo próprio autor e viraram realidade durante a gestão de Gilberto Gil no Ministério da Cultura. O livro faz questão de reforçar que a política dos Pontos de Cultura não se resume a inclusão social, uma vez que se foca na potência, não na carência dos contemplados. Já no primeiro capítulo, a história da criação do primeiro cinema do Vale do Jequitinhonha por um dos Pontos se entrelaça com a letra da música “Notícias do Brasil”, dos mineiros Milton Nascimento e Fernando Brant. Anunciando um país que se “desesconde”, Célio começa a contar a história dos Pontos e a sua própria, passeando por pessoas, lugares, sensações e momentos históricos tão diversos quanto os projetos abordados. Servidor público de carreira e historiador por formação, Célio lança um olhar teórico e empírico sobre o papel do Estado na formulação de políticas culturais que garantam autonomia aos atores sociais envolvidos. O autor aposta na cultura como a chave para a construção de uma nova política no século XXI: "Por muito tempo pensamos que a mudança na ordem social e no caráter do Estado aconteceria pelas mudanças na estrutura econômica. A cultura, como reflexo do ambiente econômico, mudaria depois. Assim, revolucionários e reformadores dirigiam seu pensamento e energias para o campo da economia política, pois tudo o mais seria decorrência. Enganamo-nos”. Por isso, enxerga nos Pontos de Cultura uma alternativa real de empoderamento e protagonismo social, expressões constantes em seu discurso. Célio aposta em um Estado "gasoso" - que esteja em toda parte e seja maleável - e "orgânico" - ou seja, vivo e interagindo com o povo. “Desse ponto, mesmo os erros e atritos entre os procedimentos burocráticos do Estado e a experiência vivenciada pelos Pontos de Cultura são positivos e necessários ao processo de aprendizado para a construção de uma nova cultura política”. Por buscar ser uma política de Estado e não de governo, há maiores condições de controle social e cobrança da continuidade da ação dos Pontos. Mais do que uma política pública, os Pontos de Cultura se configuram como um movimento social, “descobrindo a igualdade na essência apesar da diversidade na forma”. O autor também não deixa de lado as críticas sobre a burocracia do projeto, mas enxergando as pessoas e processos por trás das máquinas e instituições. Célio cita exemplos curiosos de impasses vivenciados durante os cinco anos acompanhando as atividades dos Pontos, como, por exemplo, quando um carimbo no verso de uma página em branco atrasou um repasse de verbas por meses. As histórias narradas sobre os Pontos se cruzam com a sua própria. Em função disto, vários trechos e argumentos se repetem ao longo do texto, quase que literalmente. Reconhecido como uma referência em gestão cultural na América Latina, o modelo dos Pontos de Cultura deve continuar em constante descobrimento, “praticando o canibalismo cultural dos novos tempos”, segundo ele. Apesar do tom romântico das conclusões em relação ao papel do programa na sociedade, em todas suas análises, Célio aponta os objetivos, declara suas motivações, mede os possíveis riscos e termina por apostar no novo. Radical, utópico e comunista, como o mesmo faz questão de afirmar. Ao fim, uma auto-entrevista sintetiza as idéias apresentadas ao longo do livro, buscando “abrir o código fonte dos Pontos de Cultura”, através da documentação do trabalho para que se possa dar continuidade a este conceito de política pública. Porém, se por um lado há uma nova dinâmica na produção cultural, que foge aos moldes hegemônicos dos grandes meios de comunicação, também é preciso ter cuidado para não cair no erro de acreditar que as tradicionais formas tenham chegado ao fim. Do mesmo modo, ainda que o caminho percorrido nos cinco anos de atuação dos Pontos tenha mostrado bons resultado, muito há a se fazer ainda para conseguir conciliar tradição e inovação. Estado e sociedade. Cultura e política. E ponto. Aline Carvalho é autora do livro ‘Produção de Cultura no Brasil: Da Tropicália aos Pontos de Cultura’, formada em Estudos de Mídia pela Universidade Federal Fluminense e trabalha na Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro. Publicado originalmente em: http://rhbn.com.br/v2/home/? |
Há 6 anos
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