domingo, 13 de dezembro de 2009

A caminho da 1º Conferência Nacional de Comunicação


Hoje, 14 de dezembro de 2009, começa a 1º Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). O que poderia ser uma oportunidade para a revisão do modelo de telecomunicações, a caminho da democratização da mídia no país, corre o risco de ser um jogo de cartas marcadas entre um setor empresarial pouco aberto a mudanças estruturais no atual sistema e um movimento social já desgastado depois de 8 meses de construção de Conferência - e anos de luta.

O Ministro das Comunicações Hélio Costa, em entrevista ao programa Roda Viva na ultima segunda feira, declarou acreditar que "os dois segmentos estão em pé de igualdade no debate", com 40% de delegados cada, não cabendo ao poder público, com 20% de representatividade, intervir em nas chamadas "questões sensíveis". Por "questões sensíveis" entende-se: restrições a outorgas de concessões a emissoras com irregularidades legais (como vinculação a cargos políticos e igrejas), cotas para produções regionais e independentes e a descriminalização de rádios comunitárias - apenas para citar alguns exemplos. Na verdade, o próprio sistema de comunicação do país é uma questão sensível, uma vez que está enraizadamente concentrado em poucas mãos e desatualizado frente às novas tecnologias da informação.

A legislação do setor permanece praticamente intacta desde a época da ditadura militar, quando a comunicação de massa se instaurou no Brasil com forte apoio por parte do governo. O importante papel de integração nacional que outrora desempenhou, hoje é uma das principais razões para a manutenção das desigualdades sociais no país. Mas em nome da "liberdade de expressão" o próprio Ministro deixa bem claro que "o controle social da mídia é um dos temas mais temerosos da Confecom". Ex funcionário da Rede Globo, Helio Costa faz coro ao discurso empresarial neoliberal de que não cabe ao Estado estabelecer políticas para mídia, pois esta regulação é e deve continuar sendo do mercado.

Reivindicação dos movimentos de comunicação há anos, o estabelecimento de novos marcos regulatórios são fundamentais em um contexto de novas possibilidades midiáticas como a internet e a tv digital, que hoje não encontram qualquer referência na legislação, ainda a mesma da época do vídeo cassete. Pressionado por setores da sociedade civil por ser um governo dito popular e já ter realizado uma série de Conferências Nacionais em outros setores (como Segurança Pública, Saúde e Educação), o presidente Lula anunciou no Fórum Social Mundial no inicio deste ano a convocação da Conferência, agora para o "sensível" setor das Comunicações.

É curioso como o mesmo governo que fechou mais rádios comunitárias que o governo FHC mantém uma política cultural autenticamente inovadora como o Programa Cultura Viva (com o reconhecimento de milhares de iniciativas culturais pelo país) e o Fórum da Cultura Digital Brasileira (o primeiro fórum do mundo convocado pelo poder público que reúne pesquisadores, técnicos, ativistas e governo para criação de diretrizes para a construção de políticas publicas para este novo setor). A Conferência Nacional de Cultura, que terá sua segunda edição em março do ano que vem, irá consolidar junto ao crescente movimento cultural do país uma série de indicadores e políticas que vem sendo trbalhados desde 2004, quando deu-se início a uma profunda transformação no Ministério da Cultura e nas políticas públicas do setor, através de seu ministro, Gilberto Gil.

Já no caso da Comunicação, este processo de construção tem sido radicalmente diferente. A divisão de representatividade na comissão organizadora entre poder público (20%), empresários (40%) e sociedade civil (40%), não condiz com a realidade, e a necessidade do quórum qualificado de 60% para aprovação das tais “questões sensíveis” significa praticamente o poder de veto dos empresários justamente nas questões que mais interferem nos interesses privados sobre o bem público que é a comunicação. O não reconhecimento das conferências municipais e estaduais como etapas preparatórias, a misteriosa inscrição dos 130 observadores livres pela internet e indefinições na emissão de passagens dos delegados são alguns exemplos das dificuldades enfrentadas por quem de fato construiu esta Conferência: os movimentos sociais.

Sindicatos, professores, estudantes, técnicos, rádios e tvs comunitárias, mandatos populares, produtores culturais, pontos de cultura e muita gente se organizou em fóruns locais para debater e lutar pela democratização da comunicação. Para além do fato histórico que é a realização desta 1º Conferência Nacional de Comunicação, o mais importante foi este processo que, apesar de todos os problemas estruturais, metodológicos - e, sem dúvidas, políticos -, ampliou o movimento da comunicação no país e serviu para a consolidação de uma agenda de debates que não pode ter seu fim na Confecom, muito pelo contrário: teremos muito trabalho pela frente.

Acompanhe a 1° Confecom pelo Twitter: @alinecarvalho

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